O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que é nula a sentença proferida em ação de alteração do regime das responsabilidades parentais na qual o tribunal condene o requerido no pagamento da totalidade das despesas tidas pela mãe com os filhos antes da propositura da ação, quando a mesma apenas havia pedido a sua condenação no pagamento de metade desses valores.
O caso
Em junho de 2016, uma mãe requereu contra o pai dos seus dois filhos a alteração do regime das responsabilidades parentais, pedindo que a prestação de alimentos, no valor de 400 euros mensais para cada menor, fosse aumentada para 750 euros. Pediu, ainda, a condenação do pai no pagamento da meação das despesas realizadas até à data da propositura da ação, no valor de 11.200 euros. Fê-lo alegando que o montante das pensões tinha sido fixado em 2006 e que se tornara insuficiente face ao aumento das despesas dos filhos.
Em 2019 foi proferida sentença alterando para 700 euros mensais o valor da pensão de alimentos devida a cada um dos filhos, um deles entretanto já maior e a estudar na faculdade, e condenando o pai a pagar os 11.200 euros devido a título de despesas realizadas até à data da propositura da ação. Inconformado com esta decisão, ele recorreu para o TRP.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O TRP concedeu parcial provimento ao recurso, alterando para 550 euros o montante da prestação de alimentos a entregar pelo pai por cada um dos seus filhos, num total de 1.100 euros, devidos desde a data da propositura da ação, e absolvendo-o do pedido de pagamento das despesas anteriores à data da propositura da ação.
Decidiu o TRP que é nula a sentença proferida em ação de alteração do regime das responsabilidades parentais na qual o tribunal condene o requerido no pagamento da totalidade das despesas tidas pela mãe com os filhos antes da propositura da ação, quando a mesma apenas havia pedido a sua condenação no pagamento de metade desses valores.
Diz a lei que, sob pena de nulidade, a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir. Assim, se o tribunal condenar o requerido numa quantia superior à liquidada e expressamente peticionada no requerimento inicial haverá, nessa parte, nulidade da sentença, por condenação além do pedido.
É o que ocorre quando, em ação destinada a obter o aumento do valor da prestação de alimentos, relativamente aos filhos e devida pelo progenitor requerido, seja pedida a sua condenação no pagamento de metade das despesas anteriores à propositura da ação e o tribunal o condene no pagamento da totalidade dessas despesas, acrescidas de juros.
A tal não obsta o facto de se estar perante um processo de jurisdição voluntária, uma vez que, embora neste se verifique uma prevalência do princípio do inquisitório sobre o do dispositivo e um predomínio da equidade com desvalorização da legalidade estrita, o mesmo não pode alhear-se da legalidade processual mínima que, a não ser atendida, desautorizaria o princípio do contraditório e da igualdade das partes.
Admitir que o tribunal pudesse condenar num valor superior àquele que foi peticionado seria levar o entendimento das possibilidades de decisão na jurisdição voluntária a um nível violador daqueles princípios, confrontando o requerido com uma condenação concreta que contra si não foi efetivamente deduzida, quando não estava em causa a fixação do valor da prestação de alimentos, esta sim, eventualmente enquadrável num juízo de equidade.
Mais, sendo nula a parte da sentença que condenou o pai no pagamento da totalidade das despesas anterior invocadas pela mãe para suportar o seu pedido de alteração da prestação de alimentos, e dispondo a lei que os alimentos são devidos apenas desde a propositura da ação de alteração, não existe nenhum título jurídico que permita sustentar o pedido de pagamento das mesmas, impondo-se a absolvição do requerido.
O TRP afirmou, ainda, que a maioridade de um dos filhos, ocorrida na pendência da ação, não obsta ao prosseguimento da mesma nem a que a totalidade da prestação, devida em relação a esse filho, seja entregue à mãe, que foi quem fez e vai fazendo as correspondentes despesas.
Quanto ao valor da pensão de alimentos, entendeu o TRP que, resultando provado que a totalidade dos gastos relativos a cada um dos filhos nunca ultrapassaria a média de 1.100 euros mensais e devendo a comparticipação de cada progenitor ser de igual medida, a comparticipação do pai devia ser fixada em 550 euros mensais, devidos desde a data da propositura da ação.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 67/05.5TMMTS-R.P1, de 9 de setembro de 2019
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