O Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) decidiu que deve ser considerado justificado o exercício, a título parcial e não permanente, de uma segunda atividade, em incumprimento das condições impostas pelo Programa de Apoio ao Empreendedorismo e à Criação do Próprio Emprego, motivado pela necessidade da beneficiária se manter a si própria, ao seu agregado familiar e à empresa criada ao abrigo desse mesmo programa.
O caso
Ao ficar desempregada, em julho de 2011, uma mulher requereu o pagamento global do subsídio de desemprego para criação do próprio emprego ao abrigo do Programa de Apoio ao Empreendedorismo e à Criação do Próprio Emprego.
Para o efeito, apresentou um projeto de criação do próprio emprego que consistiu na aquisição de uma empresa já existente, de saúde e bem-estar, para a prestação de serviços de estética e venda de produtos homeopáticos e naturais.
O pedido foi deferido, tendo-lhe sido pago o valor de 43.512,96 euros, referente à totalidade do subsídio de desemprego a que tinha direito, sob condição de manter o projeto por um período mínimo de três anos.
Porém, a atividade não veio a corresponder ao esperado e a mulher começou a sentir dificuldades económicas e financeiras que a obrigaram a recorrer à sua experiência e conhecimento para, em paralelo com a sua atividade, ministrar ações de formação profissional e assim poder sustentar-se a si, ao seu agregado familiar e ao seu negócio.
Ao tomar conhecimento dessa situação, a Segurança Social considerou que a mesma constituía um incumprimento das condições impostas para a concessão da totalidade do subsídio de desemprego para criação do próprio emprego, uma vez que estava vedado o exercício de outras atividades remuneradas.
Apesar das justificações apresentadas, a Segurança Social fez cessar a atribuição do subsídio e ordenou a devolução do montante recebido. Inconformada com essa decisão, a mulher recorreu a tribunal pedindo a sua anulação. A ação foi julgada improcedente, decisão da qual recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS).
Apreciação do Tribunal Central Administrativo Sul
O TCAS concedeu provimento ao recurso, anulando o ato administrativo impugnado, ao decidir que deve ser considerado justificado o exercício, a título parcial e não permanente, de uma segunda atividade, em incumprimento das condições impostas pelo Programa de Apoio ao Empreendedorismo e à Criação do Próprio Emprego, motivado pela necessidade da beneficiária se manter a si própria, ao seu agregado familiar e à empresa criada ao abrigo desse mesmo programa.
O Programa de Apoio ao Empreendedorismo e à Criação do Próprio Emprego, que permite que o subsídio de desemprego seja pago de uma só vez, nos casos em que os interessados apresentem projeto de criação do próprio emprego, proíbe que os beneficiários possam acumular o exercício dessa atividade com outra normalmente remunerada durante um período de três anos, durante o qual estão obrigados a mantê-la.
Estipulando que o incumprimento injustificado das obrigações decorrentes da aprovação do projeto de criação do próprio emprego ou a aplicação, ainda que parcial, das prestações para fim diferente daquele a que se destinam implica a revogação do apoio concedido e a consequente restituição das prestações indevidamente pagas, sem prejuízo da responsabilidade contraordenacional ou penal a que houver lugar.
Assim, segundo o TCAS, não restam dúvidas que ao acumular a sua atividade, para a qual havia beneficiado do apoio da Segurança Social, com outra remunerada, a beneficiária incumpriu as obrigações decorrentes da concessão desse apoio.
Porém, a lei salvaguarda o caso dessa violação ter uma justificação aceitável, circunstância em que não haverá lugar à cessação do apoio e à restituição das verbas recebidas.
Nesse sentido, é de considerar justificado o incumprimento decorrente do exercício de uma segunda atividade profissional quando se tenha provado que sem esta a beneficiária não teria tido condições para viver, nem para evitar o fecho da empresa criada.
Segundo o TCAS seria manifestamente excessivo, desequilibrado, irracional e injusto que a lei pudesse tolerar que a beneficiária fosse obrigada a encerrar a empresa criada através da concessão de apoios à criação do próprio emprego e a viver sem um bem-estar mínimo devido à exclusividade que lhe é exigida, precisamente por causa de tal empresa, onde ela, aliás, não deixou de trabalhar.
Pelo que, tendo o exercício dessa segunda atividade profissional permitido a manutenção do posto de trabalho e da empresa criada com a ajuda do subsídio de desemprego e, também, para que ela vivesse com pouco mais do que uma remuneração mínima equivalente ao salário mínimo nacional, esse incumprimento tem de ser necessariamente considerado justificado, sob pena de violação dos princípios gerais da justiça e da proporcionalidade administrativa.
Via | LexPoint
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