O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que, como no contrato de locação financeira, salvo estipulação em contrário, o risco de perda ou de deterioração do bem, ainda que resultante de caso fortuito ou de força maior ou de ato praticado por terceiro, corre por conta do locatário, este continua obrigado a pagar as rendas devidas a partir do momento em que se verifique a perda do bem.
O caso
Em 2007, uma empresa celebrou um contrato de locação financeira de um veículo automóvel, prevendo o pagamento de 48 rendas e de um valor residual no final do contrato.
A empresa deixou de pagar as rendas em 2008, tendo em janeiro de 2009 participado criminalmente o furto do veículo, ocorrência que comunicou de imediato à locadora e à seguradora.
Esta última disponibilizou-se a pagar à locatária uma indemnização pela perda do veículo, tendo a locadora, perante a falta de pagamento das rendas, procedido ao preenchimento da livrança entregue aquando da assinatura do contrato e intentando uma ação executiva para cobrança dos valores em dívida.
O avalista da livrança opôs-se à execução, mas sem sucesso, tendo posteriormente recorrido para o Tribunal da Relação do Porto.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O Tribunal da Relação do Porto (TRP) negou provimento ao recurso ao decidir que, como no contrato de locação financeira, salvo estipulação em contrário, o risco de perda ou de deterioração do bem, ainda que resultante de caso fortuito ou de força maior ou de ato praticado por terceiro, corre por conta do locatário, este continua obrigado a pagar as rendas devidas a partir do momento em que se verifique a perda do bem.
A locação financeira é o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados.
Assim, o contrato de locação financeira pressupõe a existência de dois contratos distintos, de um lado, o contrato de compra e venda entre o comprador e a sociedade de leasing, e do outro, o contrato de locação financeira propriamente dito, celebrado entre a sociedade de leasing e o utilizador.
Nos termos da lei, salvo estipulação em contrário no contrato, o risco de perda ou de deterioração do bem corre por conta do locatário.
Sendo que a lei não restringe o risco do locatário a factos que lhe sejam imputáveis, pois o locador financeiro deve permanecer à margem de qualquer vicissitude que afete a coisa, transferindo-se para o locatário qualquer responsabilidade não decorrente de facto do locador, o que implica que o locatário responda pela perda ou deterioração da coisa locada, ainda que tal resulte de caso fortuito ou de força maior ou de ato praticado por terceiro
Em consonância com a responsabilidade pelo risco de perda do bem, impõe-se ao locatário a obrigação de efetuar seguro do bem locado
Assim sendo, correndo o risco da perda do bem pelo locatário, este não fica desonerado da obrigação de pagar as rendas vincendas após a perda do bem, sendo legítimo que a locadora exija esse pagamento, com recurso à ação executiva.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 4611/10.8T8MAI-A.P1, de 14 de março de 2017
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