O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) decidiu que é anulável o contrato de seguro de vida em cuja celebração a segurada tenha declarado estar de boa saúde quando padecia já de queixas relacionadas com a doença que lhe viria a ser diagnosticada posteriormente e a dar origem à sua declaração de invalidez.
O caso
Em abril de 2015 um casal contraiu um empréstimo bancário para fazer face a despesas pessoais de ambos e a despesas com a entrada da sua filha na Universidade, tendo contratado o seguro de vida exigido pela entidade financeira para garantir o pagamento do capital mutuado pelo prazo global do empréstimo.
Mas, devido a queixas sentidas anteriormente, em maio desse mesmo ano a mulher viu ser-lhe diagnosticada uma patologia, designada por coxartrose bilateral, que, em maio de 2017, levou a que lhe fosse fixado um grau de incapacidade permanente e definitiva de 0,6777, ficando impossibilitada de fazer esforços físicos e de exercer qualquer profissão.
Em consequência, ela acionou o seguro, mas a seguradora, ao constatar que a mulher tinha uma prótese total da anca direita implantada em 2015, declinou o pagamento do capital seguro, considerando a situação pré-existente à contratação do seguro e procedendo à anulação do mesmo, por prestação de falsas declarações sobre a situação de saúde, mantendo o seguro válido apenas em relação ao marido.
Inconformada, a mulher recorreu para tribunal, alegando que não tinha sido devidamente informada sobre a declaração de saúde que subscrevera e que não faltara à verdade ou omitira quaisquer factos na medida em que, à data da subscrição do seguro, não sabia que padecia da doença que dera origem à invalidez.
O tribunal limitou-se a condenar a seguradora a restituir à autora o valor do prémio que esta pagara após a anulação do seguro, decisão com a qual ela não se conformou, tendo recorrido para o TRG.
Apreciação do Tribunal da Relação de Guimarães
O TRG julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida, ao decidir que é anulável o contrato de seguro de vida em cuja celebração a segurada tenha declarado estar de boa saúde quando padecia já de queixas relacionadas com a doença que lhe viria a ser diagnosticada posteriormente e a dar origem à sua declaração de invalidez.
O conceito clínico de boa saúde é um conceito indeterminado, por encerrar palavras ou expressões vagas e imprecisas, devendo o seu preenchimento ser feito caso a caso.
Estando em causa um contrato de seguro subscrito em 16/04/2015, num momento em que a segurada já apresentava queixas relacionadas com a coxartrose bilateral que lhe foi diagnosticada no dia 04/05/ 2015 e considerando o tipo de doença em causa, que é dolorosa e da qual resulta uma elevada incapacidade, é de considerar que, aquando da celebração do contrato de seguro, cerca de 20 dias antes do diagnóstico da doença, a mesma tinha que saber que não estava de boa saúde. Era este o sentido que seria apreendido por um declaratário normal, ou seja, medianamente instruído e diligente, colocado na mesma situação.
Pelo que, tendo a segurada declarado que estava de boa saúde, é de confirmar a anulação do contrato e a recusa da seguradora em pagar o capital seguro, uma vez que o tomador do seguro ou o segurado está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exatidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para a apreciação do risco pela seguradora.
Via |LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 6748/17.3T8VNF.G1, de 4 de abril de 2019
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