O Tribunal da Relação do Porto (TRP) decidiu que comete o crime de devassa da vida privada quem, sem autorização da pessoa visada, e estando ciente do respetivo conteúdo, intencionalmente divulga fotografias onde aquela se encontra retratada despida, em roupa interior e em poses de natureza sexual.
O caso
Uma mulher foi condenada no pagamento de uma multa e de uma indemnização pela prática de um crime de devassa da vida privada depois de ter mostrado a várias pessoas, à mesa de um café, fotografias íntimas e de teor sexual de outra mulher que lhe tinham chegado à sua posse e que tinha guardadas no seu telemóvel.
Fotografias essas que tinham sido obtidas por alguém que acedera indevidamente ao disco rígido do computador da visada e depois divulgadas através de uma página criada no Facebook sob um perfil falso.
Discordando dessa condenação, a arguida recorreu para o TRP alegando que apenas mostrara a um grupo restrito de três pessoas cinco fotografias que estavam a circular na Internet, sem qualquer intenção de prejudicar a pessoa retratada nessas fotografias ou de obter qualquer benefício ilegítimo.
Apreciação do Tribunal da Relação do Porto
O TRP negou provimento ao recurso ao decidir que comete o crime de devassa da vida privada quem, sem autorização da pessoa visada, e estando ciente do respetivo conteúdo, intencionalmente divulga fotografias onde aquela se encontra retratada despida, em roupa interior e em poses de natureza sexual.
Diz a lei que quem, sem consentimento e com intenção de devassar a vida privada das pessoas, designadamente a intimidade da vida familiar ou sexual, captar, fotografar, filmar, registar ou divulgar imagem das pessoas ou de objetos ou espaços íntimos, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias.
Não obstante, essa intenção de devassar a vida privada das pessoas, referida na lei, enquanto elemento subjetivo típico do crime, não assume uma autonomia específica, tendo apenas como efeito prático dizer que o crime de devassa da vida privada só admite o dolo direto e que se trata, portanto, de um crime de dolo específico ou, então, segundo um outro entendimento, apenas para afastar a punibilidade com dolo eventual.
Quem age mostrando e divulgado fotografias de outra pessoa despida ou em roupa interior, em poses íntimas e de cariz sexual, querendo e sabendo que ao fazê-lo está a divulgar facto pertinente à intimidade da pessoa visada, logicamente também está a agir com a intenção de devassar a vida privada dessa mesma pessoa.
Como tal, basta a prova de que a arguida agiu com vontade de exibir a diversas pessoas as fotografias em causa, de teor íntimo e sexual, obtidas sem a necessária autorização, de forma livre e consciente, apesar de saber que tal conduta era punível e proibida por lei, para que se considere verificada a prática do crime de devassa da vida privada.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.º 3827/16.8JAPRT.P1, de 6 de fevereiro de 2019
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