O Tribunal da Relação de Guimarães (TRG) decidiu que não se verificam os pressupostos para a atribuição de responsabilidade penal a pessoa coletiva numa situação em que o crime de incêndio florestal é cometido por um mero trabalhador da empresa, sem que se tenha provado que a prática do crime só ocorreu em virtude de uma violação, por parte do líder, dos seus deveres de controlo e supervisão.
O caso
Um trabalhador de uma empresa florestal, que exercia as funções de encarregado e chefe de equipa, responsável pela segurança da queima de sobrantes, cabendo-lhe controlar e fiscalizar os trabalhos que antecediam as queimas, foi almoçar com a sua equipa enquanto os amontoados de sobrantes ardiam, afastando-se alguns metros das fogueiras e deixando-as sem nenhuma supervisão.
Enquanto almoçavam, faúlhas provindas de uma das queimas foram projetadas para o talude superior do estradão, originando um foco de incêndio num terreno baldio, que obrigou à intervenção dos bombeiros.
Em consequência, o trabalhador e a empresa foram condenados pela prática de um crime de incêndio florestal, decisão com a qual a empresa não se conformou, dela recorrendo para o Tribunal da Relação de Guimarães (TRG).
Apreciação do Tribunal da Relação de Guimarães
O TRG concedeu provimento ao recurso, absolvendo a empresa, ao decidir que não se verificam os pressupostos para a atribuição de responsabilidade penal a pessoa coletiva numa situação em que o crime de incêndio florestal é cometido por um mero trabalhador da empresa, sem que se tenha provado que a prática do crime só ocorreu em virtude de uma violação, por parte do líder, dos seus deveres de controlo e supervisão.
Diz a lei que as pessoas coletivas podem ser responsabilizadas criminalmente, nomeadamente pela prática do crime de incêndio florestal, quando este seja cometido em seu nome e no interesse coletivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança, ou por quem aja sob a autoridade dessas pessoas, em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem.
Para o efeito, entende-se que ocupam uma posição de liderança os órgãos e representantes da pessoa coletiva e quem nela tiver autoridade para exercer o controlo da sua atividade.
Ora, segundo essa definição, no caso o crime não foi cometido por pessoa que ocupasse uma posição de liderança na empresa, uma vez que se tratava de um mero trabalhador, que na altura desempenhava funções de chefe da equipa que laborava no terreno, e não de membro de órgão nem representante da pessoa coletiva, e que não tinha autoridade para exercer o controlo e fiscalização da atividade da pessoa coletiva.
Por outro lado, embora o trabalhador tenha cometido o crime enquanto trabalhava em nome e no interesse da pessoa coletiva, não se tendo provado nem sido alegado que a prática do crime só ocorreu em virtude de uma violação, por parte do líder, dos seus deveres de controlo e supervisão, não pode a empresa ser responsabilizada criminalmente.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 23/14.2GCVPA.G1, de 9 de outubro de 2017
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