O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que integra justa causa de despedimento o comportamento do trabalhador, diretor de restaurante, que se dirige a trabalhadoras suas subordinadas com comentários de índole sexual, que as convida para irem com ele para um motel, insiste em lhes dar boleia e faz comentários sobre o seu corpo, incomodando-as e deixando-as constrangidas.
O caso
Inconformado com o seu despedimento, o diretor do restaurante de um hotel recorreu a tribunal pedindo para que o mesmo fosse declarado ilícito. A empregadora contestou reafirmando os factos constantes da nota de culpa, segundo os quais o trabalhador praticara condutas irregulares de assédio moral e sexual para com outras trabalhadoras, suas subordinadas, fazendo comentários de índole sexual, convidando-as para irem com ele para um motel, insistindo em lhes dar boleia e fazendo comentários sobre o seu corpo, incomodando-as e deixando-as constrangidas. Factos que o mesmo negou, alegando ser vítima de uma campanha de perseguição. Mas a ação foi julgada improcedente e declarado lícito o despedimento, decisão da qual o trabalhador recorreu para o TRL.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL julgou o recurso improcedente ao decidir que integra justa causa de despedimento o comportamento do trabalhador, diretor de restaurante, que se dirige a trabalhadoras suas subordinadas com comentários de índole sexual, que as convida para irem com ele para um motel, insiste em lhes dar boleia e faz comentários sobre o seu corpo, incomodando-as e deixando-as constrangidas.
O conceito de justa causa de despedimento corresponde a um comportamento culposo do trabalhador, violador dos seus deveres contratuais, gerador de uma crise contratual de tal modo grave e insuperável que provoca uma rutura irreversível a ponto de não ser exigível a um empregador normal e razoável a continuação da relação laboral.
No caso, os comportamentos do trabalhador para com as suas subordinadas, jovens e a precisarem de trabalho, repetidos no seu dia-a-dia de trabalho, deixaram-nas melindradas, obrigando-as mesmo a mudarem de emprego, não podendo ser entendidos como meros piropos ou brincadeiras, sem gravidade.
Estão em causa comportamentos não aceites, nem consentidos pelas visadas, que violam os deveres de respeito e urbanidade do trabalhador para com o empregador e para com os outros trabalhadores, de tal gravidade que, a se provarem em sede própria, podem mesmo constituir ilícito criminal, não sendo de exigir ao empregador que mantenha o trabalhador ao seu serviço.
Não podendo uma entidade patronal, para mais sendo esta um hotel de renome, continuar a confiar num chefe seu que tem essas atitudes intoleráveis e injustificáveis e que torna o ambiente insustentável para as trabalhadoras suas subordinadas que sejam jovens e do seu agrado, pondo em causa todo o hotel. A sua manutenção ao serviço seria ofensivo para com as trabalhadoras visadas pelos atos praticados e para com as demais subordinadas que, não se tendo queixado e a quem nada sucedeu, saberiam que, a suceder no futuro, esses atos permaneceriam impunes.
Acresce que, face à gravidade dos factos, a circunstância do trabalhador não ter antecedentes disciplinares e ter sido considerado por duas vezes o empregado do mês e mesmo o empregado do ano, não assume peso suficiente para afastar a gravidade do seu comportamento. Pelo contrário, sendo um profissional competente, maior se revela a sua responsabilidade face às trabalhadoras suas subordinadas. E embora a sanção de despedimento só deva ser aplicada quando as demais sanções disciplinares se revelarem insuficientes, a tolerar-se este tipo de comportamento anular-se-ia o poder de autoridade da empregadora, bem como obstar-se-ia à concretização da obrigação que impende sobre a mesma de proporcionar aos seus trabalhadores boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral, pelo que, face à natureza dos factos praticados, entendeu o TRL que não seria adequada e suficiente a aplicação de uma sanção que passasse pela manutenção do vínculo laboral.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 5488/19.3T8LSB.L1-4, de 18 de dezembro de 2019
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