O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que, embora não seja diretamente aplicável ao arrendamento de casa de morada de família constituído judicialmente, após o fim da união de facto, deve servir como linha orientadora para a fixação do prazo de duração desse arredamento a norma que estipula qual o prazo do arrendamento para habitação em caso de silêncio das partes.
O caso
Uma mulher recorreu a tribunal pedindo para que fosse declarada a dissolução da união de facto que mantivera com o seu companheiro, com efeitos a 01/01/2015, e lhe fosse reconhecido o direito de compropriedade sobre o imóvel que aquele adquirira durante a relação ou, pelo menos, assegurada a possibilidade de nele residir mediante constituição de um arrendamento.
Fê-lo alegando que durante o seu relacionamento de 15 anos tinham tomado a decisão de adquirirem uma casa para onde tinham ido viver, a qual, no entanto, ficara registada apenas em nome dele para poderem beneficiar de crédito bonificado jovem, embora ela tivesse contribuído com dinheiro para a entrada da casa e comparticipado nas despesas com a sua manutenção e obras. Disse, ainda, que passara a suportar a prestação do empréstimo a partir do momento em que o seu companheiro saíra de casa, em janeiro de 2015, e que, sendo a sua condição económica muito modesta não tinha outra casa onde pudesse habitar.
O tribunal declarou a dissolução da união de facto determinado a atribuição à autora, através de arrendamento para habitação, da casa da morada de família, mediante o pagamento de uma renda de 290 euros mensais, sendo o contrato válido por um ano, automaticamente renovável por iguais períodos, sem prejuízo da possibilidade do senhorio se poder opor a essa renovação. Condenou, ainda, o réu no pagamento à autora dos 2.500 euros que esta lhe tinha entregue para entrada da casa e obras.
Insatisfeita com esta decisão, a mulher recorreu para o TRL defendendo que tinha direito a um arrendamento com duração indeterminada ou, no pior cenário, de pelo menos cinco anos e a receber mais do que os 2.500 euros, bem como a uma indemnização por danos morais.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL concedeu parcial provimento ao recurso, aumentando para dois anos o prazo do arrendamento, automaticamente renovável por iguais períodos, confirmando em tudo o mais a sentença recorrida.
Decidiu o TRL que, embora não seja diretamente aplicável ao arrendamento de casa de morada de família constituído judicialmente, após o fim da união de facto, deve servir como linha orientadora para a fixação do prazo de duração desse arredamento a norma que estipula qual o prazo do arrendamento para habitação em caso de silêncio das partes.
Resulta da lei que o tribunal pode dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu pedido, a casa de morada de família, quer essa seja comum quer própria do outro, considerando, nomeadamente, as necessidades de cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal. Arrendamento constituído judicialmente que é possível também em caso de dissolução da união de facto, ficando sujeito às regras do arrendamento para habitação.
Ora, nesse sentido, diz a lei que o contrato de arrendamento urbano para habitação pode celebrar-se com prazo certo ou por duração indeterminada e que, no silêncio das partes, o contrato considera-se celebrado por prazo certo, pelo período de cinco anos, prazo esse que, na redação anterior, era de dois anos. Sendo que, também salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração, sem prejuízo de qualquer uma das partes poder, dentro dos prazos legais, opor-se a essa renovação.
Em suma, o contrato de arrendamento para habitação é um contrato de caráter temporário, atualmente sem prazo de duração mínima e com um prazo máximo de duração de 30 anos, embora nada impeça as partes de optarem por celebrar um contrato com duração indeterminada.
No caso, sendo manifesta a inexistência de desafogo económico do proprietário do imóvel, é de afastar a imposição de um arrendamento de duração indeterminada. Não obstante, entendeu o TRL ser excessivamente curto um prazo de apenas um ano, tendo em conta que a condição económica da arrendatária, em larga medida dependente de uma parca reforma de cerca de 300 euros mensais, implicaria, com grande probabilidade, que a mesma necessitasse de período com maior extensão temporal para procurar uma alternativa habitacional futura satisfatória.
Assim, seguindo como linha orientadora a lei em vigor à data da entrada em juízo da ação, em julho de 2016, a qual, no silêncio das partes, previa um prazo certo de dois anos para o arrendamento, entendeu o TRL ser esse o prazo mais adequado, com renovação automática por igual período.
Quanto ao mais, o TRL afastou o pagamento de quaisquer outros valores, quer por falta de prova da entrega dos mesmos para a compra da casa, quer porque uma indemnização por danos não patrimoniais pressupõe a prática de um ato ilícito, inexistindo ilicitude no quadro do regular exercício de um direito como seja a opção pela separação ou a intenção de venda do imóvel por parte do titular do direito de propriedade sobre o mesmo.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 17441/16.4T8LSB-L1-8, de 6 de dezembro de 2018
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