O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) decidiu que a eliminação do apelido do autor da perfilhação do nome da criança não é uma consequência obrigatória e automática da procedência da ação de impugnação da paternidade por perfilhação, só devendo ser ordenada se for do interesse da criança, designadamente tendo em conta o seu direito à identidade pessoal, na vertente do direito ao nome, como direito de personalidade.
O caso
Em 2013, o alegado pai de duas crianças intentou uma presente de impugnação da perfilhação, pedindo para que se declarasse que o autor da perfilhação não era o pai dos menores e para que se procedesse à retificação do assento de nascimento, com eliminação da paternidade e dos apelidos.
Alegou para tanto que mantivera uma relação de namoro com a mãe das crianças, nascidas em setembro de 2007, durante o período legal da conceção.
Realizados os exames de sangue, estes excluíram o perfilhante como pai das crianças, dando uma probabilidade de 99,9999998% de paternidade a favor do autor. Em consequência, o tribunal reconheceu que os menores não eram filhos do perfilhante, ordenando que fosse eliminada essa paternidade do registo de nascimento das crianças, bem como o apelido do perfilhante. Desta decisão foi interposto recurso para o TRL.
Apreciação do Tribunal da Relação de Lisboa
O TRL julgou o recurso parcialmente procedente, revogando a sentença recorrida apenas na parte em que ordenara a eliminação, no registo do nascimento dos menores, do apelido do autor da perfilhação.
Decidiu o TRL que a eliminação do apelido do autor da perfilhação do nome da criança não é uma consequência obrigatória e automática da procedência da ação de impugnação da paternidade por perfilhação, só devendo ser ordenada se for do interesse da criança, designadamente tendo em conta o seu direito à identidade pessoal, na vertente do direito ao nome, como direito de personalidade.
O direito ao nome constitui uma relevante vertente do direito à identidade pessoal. Porque individualiza o seu titular, ao mesmo tempo que o integra na sua família e o diferencia perante a comunidade, o nome representa uma parte essencial da identidade pessoal que caracteriza cada pessoa como indivíduo singular e irredutível.
Como tal, embora as mudanças que possam ocorrer em consequência de ações respeitantes ao reconhecimento e impugnação da maternidade e da paternidade possam determinar a alteração do nome, em relação aos respetivos apelidos, há que ter em conta também as normas, com proteção constitucional, respeitantes à identidade pessoal dos menores, no caso na vertente do seu direito ao nome, como direito de personalidade, e a necessidade de ter sempre em conta nas decisões relativas às crianças, primacialmente, o interesse superior destas.
Assim sendo, as crianças só perdem o apelido do autor do reconhecimento impugnado com êxito, se, tendo primacialmente em consideração o interesse superior delas, se puder dizer que assim deve ser.
Tendo a ação de impugnação sido instaurada quase seis anos depois do nascimento dos menores e sido decidida quase onze anos depois, não se sabendo se o autor pretendia ou não ver reconhecida a sua paternidade, havendo o risco de eles ficarem sem qualquer apelido da linha paterna, o que não é comum acontecer em Portugal, onde as pessoas são normalmente conhecidas por esse mesmo apelido, e não prejudicando a sua manutenção a procedência da ação e a retificação dos registos de nascimento, decidiu o TRL que era de manter os apelidos, até porque os menores, atingido os 16 anos, podiam sempre solicitar a alteração do seu nome, se assim o entendessem.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 13823/13.1T2SNT, de 25 de outubro de 2018
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