O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é inconstitucional o prazo de caducidade de dez anos após a maioridade ou emancipação previsto na lei para a investigação de paternidade.
O caso
Perante rumores de que seria outro o seu verdadeiro pai, uma mulher, nascida em 1979, intentou em 2016 uma ação de impugnação e de investigação de paternidade. Fê-lo pedindo para ser reconhecida como filha daquele que mantivera um relacionamento amoroso com a sua mãe antes dela nascer, bem com o seu direito à herança do mesmo, uma vez que ele falecera um mês antes do seu nascimento.
Mas o tribunal entendeu que havia caducado o direito de intentar a ação, decisão da qual foi interposto recurso para o Tribunal da Relação e depois para o STJ.
Apreciação do Supremo Tribunal de Justiça
O STJ concedeu provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido, que confirmara a caducidade do direito a impugnar e investigar a paternidade, determinando que a ação prosseguisse relativamente a esses pedidos.
Decidiu o STJ que é inconstitucional o prazo de caducidade de dez anos após a maioridade ou emancipação previsto na lei para a investigação de paternidade.
Diz a lei que a ação de investigação de maternidade ou paternidade só pode ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos dez anos posteriores à sua maioridade ou emancipação.
Não obstante, a todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação.
Ora, configurando o direito ao apuramento da paternidade biológica uma dimensão essencial desse direito fundamental à identidade pessoal, os meios de reconhecimento da paternidade ou maternidade devem ser tendencialmente irrestritos, para não limitar em demasia as possibilidades de estabelecimento da filiação dos filhos nascidos fora do casamento.
Sendo que no estádio atual do desenvolvimento científico, em que os exames de ADN permitem obter uma quase certeza da paternidade, setores muito significativos da doutrina e da jurisprudência, bem como a evolução legislativa em áreas relacionadas com os direitos de personalidade e o direito comparado apontam para a ausência de outros valores ou direitos que sobrelevem o direito pessoalíssimo de conhecer e de ver reconhecida a verdade biológica da filiação, a ascendência e marca genética de cada pessoa.
Razão pela qual não se concebe atualmente a constitucionalidade de qualquer norma que estabeleça um prazo legal para que um filho possa investigar a verdade biológica da sua filiação, não podendo o exercício desse direito ficar condicionado a um prazo de caducidade de dez anos, contados após a maioridade ou emancipação, tal como ainda prevê a lei, a qual deve ser, para o efeito, desaplicada.
Via | Lexpoint
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo n.º 1731/16.9T8CSC.L1.S1, de 14 de maio de 2019
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