O Tribunal da Relação de Évora (TRE) decidiu que não constitui direito ou estado de necessidade a conduta de quem inicie a atividade de um estabelecimento destinado a lar de idosos sem estar licenciada ou autorizada com o fundamento de assim obter mais rapidamente o retorno do capital investido.
O caso
A proprietária de um lar de idosos iniciou a atividade do mesmo sem dispor da necessária licença, devido a atrasos na obtenção da mesma. Em consequência foi-lhe aplicada uma coima de 20.000 euros, com a qual ela não se conformou, tendo recorrido a tribunal justificando a abertura antecipada do estabelecimento com a necessidade de retorno urgente do capital investido e de evitar o risco de insolvência. Mas o tribunal entendeu confirmar a decisão proferida pela autoridade administrativa, decisão da qual foi interposto recurso para o Tribunal da Relação de Évora.
Apreciação do Tribunal da Relação de Évora
O Tribunal da Relação de Évora (TRE) julgou improcedente o recurso ao decidir que não constitui direito ou estado de necessidade a conduta de quem inicie a atividade de um estabelecimento destinado a lar de idosos sem estar licenciada ou autorizada com o fundamento de assim obter mais rapidamente o retorno do capital investido.
A lei prescreve que os estabelecimentos de apoio social em que sejam exercidas atividades e serviços do âmbito da segurança social relativos a crianças, jovens, pessoas idosas ou pessoas com deficiência, só podem iniciar a atividade após a concessão da respetiva licença de funcionamento.
O início de atividade do lar para idosos sem a obtenção de licença ou autorização provisória de licenciamento constitui uma contraordenação muito grave, punida com coima de 20.000 a 40.000 euros.
O interesse protegido pela lei é a saúde e o bem-estar físico, emocional e psicológico dos utentes dos estabelecimentos deste género, nomeadamente dos lares para idosos, procurando evitar o exercício ilegal de atividades de apoio social e situações de negligência e maus tratos.
Face a esse interesse, o da proprietária do lar em obter rapidamente o retorno do capital investido é sem dúvida legítimo, mas a sua conduta constitui o cerne do problema que a lei quer erradicar, ou seja, o exercício da atividade sem licenciamento que geralmente conduz a situações de negligência e maus tratos, com caráter de reincidência.
Permitir que esse seu interesse particular fosse passível de justificar a abertura do estabelecimento sem licença significaria que qualquer empresário estaria legitimado a iniciar e exercer uma atividade sujeita a licenciamento ou autorização com o simples argumento de que tem interesse em obter mais rapidamente o retorno do capital.
Este entendimento e prática são censuráveis. Não só pelo exercício de uma atividade sem estar licenciada, como também pela falta de consciência que daí parece decorrer, na medida em que sobreleva o seu interesse privado ao interesse coletivo da sociedade.
Colocados em confronto o interesse económico da proprietária com o interesse da sociedade, em que está em causa a saúde das pessoas, não resta qualquer espaço para um eventual direito ou estado de necessidade que possa justificar a sua conduta ou afastar a culpa do agente.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 3101/16.0T8STR.E1, de 13 de julho de 2017
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