O Tribunal da Relação de Évora (TRE) decidiu que a decisão de transferência das crianças de uma escola pública para outra com igual tipo de ensino, decorrente da mudança de domicílio da mãe, não é uma decisão de particular importância que possa ser tomada ou contrariada pelo tribunal.
O caso
Um pai de três crianças recorreu a tribunal pedindo para que este resolvesse o diferendo que tinha com a mãe dos seus filhos relativamente à escola que estes deviam frequentar. Para o efeito alegou que ela tinha alterado a sua residência de Loulé para Faro matriculando dois dos menores numa escola a 3,1 km de distância da sua casa e o outro a 2,7 km quando ela não dispunha de carta de condução, nem de transporte próprio. Tendo pedido para que as crianças fossem inscritas noutras escolas públicas, pertença de outro agrupamento, mais próximas da sua residência, com melhores resultados escolares e onde lecionava o tio das crianças, que lhes poderia prestar apoio logístico.
O tribunal deu razão ao pai, ordenando a mudança de escola, decisão da qual recorreu um dos menores, com 14 anos de idade, alegando que estava devidamente ambientado e integrado na escola na qual frequentava o 9.º ano, que não tinha quaisquer dificuldades em se deslocar para a mesma e que a mudança só o iria prejudicar. Alegou ainda que devia ter sido ouvido na conferência de pais e que o tribunal decidira sem ter em conta o seu interesse.
Apreciação do Tribunal da Relação de Évora
O TRE julgou procedente o recurso, revogando a decisão recorrida para que os menores continuassem a frequentar as escolas públicas nas quais tinham sido matriculados pela mãe.
Decidiu o TRE que a decisão de transferência das crianças de uma escola pública para outra com igual tipo de ensino, decorrente da mudança de domicílio da mãe, não é uma decisão de particular importância que possa ser tomada ou contrariada pelo tribunal.
Em nome do superior interesse da criança esta tem, sem dúvida, o direito a ser ouvida e a ver ser tida em conta a sua opinião, sendo-lhe conferida a possibilidade de participar nas decisões que lhe dizem respeito, com a sua autonomia e identidade próprias.
A criança ou jovem com capacidade de discernimento tem, assim, o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe digam respeito, devendo ser devidamente tomadas em consideração as suas opiniões, de acordo com a sua idade e maturidade, não se estabelecendo qualquer limite de idade para esse efeito.
Não se trata de exigir que a decisão a tomar respeite integral e necessariamente essa opinião, mas que seja considerada na ponderação dos interesses em causa e que respeite o seu superior interesse.
Tendo o menor de 14 anos de idade maturidade suficiente que lhe permita expressar a sua opinião sobre a sua mudança de escola, devia o mesmo ter sido ouvido no processo.
Não obstante, a decisão de transferência das crianças de uma escola pública para outra com igual tipo de ensino, não constitui uma decisão de particular importância, ainda que esteja em causa uma mudança para concelho diferente, decorrente da mudança de domicílio da mãe das crianças junto da qual esteja fixada a sua residência habitual.
Só a definição sobre se o menor deve ou não fazer os seus estudos num estabelecimento público ou particular é que, dada a relevância que tal decisão tem para a sua vida, constitui uma questão de particular relevância. Tomada essa decisão, a escolha de qual o estabelecimento em concreto que o menor irá frequentar constitui já um ato da vida corrente, a decidir pelo progenitor com quem o mesmo reside.
Pelo que, não estando em causa qualquer alteração no tipo de ensino, já que as crianças continuam a frequentar escolas públicas, era legítimo à mãe, com quem residiam, decidir sobre essa questão, não podendo o tribunal substituir-se a ela, determinando que os menores fossem inscritos nas escolas pretendias pelo pai.
Mais, tratando-se de uma mudança para um concelho vizinho, que não põe em causa o normal convívio com o pai, sendo a distância da residência para as escolas muito pouco significativa, traduzindo-se numa diferença de escassas centenas de metros, e sendo irrelevante o ranking dessas mesmas escolas, atenta a pouca fiabilidade dessa classificação, nunca poderiam esses argumentos justificar tal alteração.
Via | LexPoint
Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 2686/16.5T8FAR-B.E1, de 13 de fevereiro de 2020.
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