O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é abusiva, por contrária ao princípio da boa-fé, proibida e nula a cláusula especial constante das condições de contrato de seguro de grupo, destinado ao pagamento do saldo de um empréstimo por crédito à habitação em caso de invalidez absoluta e definitiva do aderente, que exija para caracterização desse estado de invalidez que o aderente fique na obrigação de recorrer à assistência permanente de uma terceira pessoa para efetuar os atos ordinários da vida corrente.
O caso:
Em setembro de 1998, um casal comprou a sua casa com recurso a empréstimo bancário tendo, nessa altura, contratado um seguro de vida para garantir o pagamento do empréstimo em caso de morte, invalidez total e permanente, por acidente, ou invalidez absoluta e definitiva, por doença.
Em 2006, o marido foi acometido de doença incapacitante, o que o obrigou a cessar a sua atividade profissional de pedreiro, ficando, desde então sem condições ou possibilidades para exercer qualquer outra atividade.
Em consequência, o casal acionou o seguro, mas a seguradora recusou-se a proceder ao seu pagamento alegando que, de acordo com as condições especiais do contrato, a sua obrigação de pagamento fundada na invalidez absoluta e definitiva exigia também que o segurado tivesse ficado na necessidade de recurso à assistência permanente de uma terceira pessoa para efetuar os atos ordinários da vida corrente, o que não sucedera.
O casal deixou de conseguir pagar o seguro e as mensalidades do crédito, tenho a mulher visto ser-lhe penhorado para do vencimento.
Alegando que só em maio de 2011 é que lhes tinham sido comunicadas as cláusulas contratuais gerais do contrato de seguro, desconhecendo até então o respetivo teor, o casal recorreu a tribunal exigindo o pagamento do seguro.
A ação foi julgada improcedente mas, após recurso interposto para o Tribunal da Relação de Guimarães, este decidiu declarar nula, por abusiva, a cláusula do contrato de seguro que fazia referência à obrigação de recorrer à assistência permanente de uma terceira pessoa para efetuar os atos ordinários da vida corrente, condenando a seguradora a proceder ao pagamento do empréstimo ao banco e a restituir ao casal as quantias pagas em resultado da penhora do vencimento da mulher. Foi, então, a vez da seguradora recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça.
Apreciação do Supremo Tribunal de Justiça:
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso, confirmando a condenação da seguradora, ao decidir que é abusiva, por contrária ao princípio da boa-fé, proibida e nula a cláusula especial constante das condições de contrato de seguro de grupo, destinado ao pagamento do saldo de um empréstimo por crédito à habitação em caso de invalidez absoluta e definitiva do aderente, que exija para caracterização desse estado de invalidez que o aderente fique na obrigação de recorrer à assistência permanente de uma terceira pessoa para efetuar os atos ordinários da vida corrente.
Segundo o STJ, essa cláusula introduz um significativo desequilíbrio contratual entre as partes, esvaziando na prática largamente a utilidade do seguro, na medida em que este visa essencialmente obrigar o segurador a pagar ao banco mutuante no caso do aderente ficar impossibilitado de o fazer por si, e esta finalidade satisfaz-se com a própria impossibilidade e sem necessidade do aderente ficar também dependente da referida assistência permanente.
Está em causa uma cláusula contratual geral, elaborada pela seguradora sem prévia negociação individual, proibindo a lei as cláusulas contratuais gerais que sejam contrárias à boa-fé. Tais cláusulas são, assim, nulas, podendo e devendo essa nulidade ser declarada oficiosamente pelo tribunal, mesmo quando não tenha sido alegada pelo segurado.
Sendo a cláusula nula, a seguradora não pode dela prevalecer-se, estando obrigada a pagar o seguro quando o segurador tenha demonstrado que, por doença, ficou incapacitado de exercer qualquer atividade remunerada.
Embora nos seguros de grupo, salvo convenção em contrário, seja sobre o banco tomador do seguro e não sobre a seguradora que recaia o dever de comunicar ao aderente as coberturas e exclusões constantes das condições gerais e especiais do contrato, não podendo o segurado prevalecer-se contra a seguradora do facto de aquelas não lhe terem sido comunicadas, essa conclusão torna-se irrelevante quando esta tenha sido condenada a pagar o seguro não em decorrência da não comunicação das coberturas e exclusões mas sim devido à nulidade da cláusula contratual.
Via | LexPoint
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo n.º 240/11.7TBVRM.G1.S1, de 27 de setembro de 2016
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